quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Belo Monte - capítulo 5: licença parcial aprovada, após pedido de demissão do presidente do Ibama

Foi rápido, bem rápido. 15 dias após o pedido de demissão do último presidente do Ibama foi aprovada uma licença parcial para início das obras de Belo Monte. O Ministério Público do Pará entrou com uma ação questionando sua legalidade. Mas é pouco. Os interesses são imensos. Uma obra de 35 bilhões, dinheiro que será em boa parte emprestado pelo BNDES, e que vai fornecer energia para grandes grupos do setor de aluminio. Ora, ora. Que Brasil  queremos senhores?



Area que será alagada...
O Xingu que morrerá, foto reportagem Donizete Tomé

Belo Monte, que era uma unanimidade na grande midia começa pouco a pouco a ser questionada por alguns jornalistas que foram pesquisar o assunto: Miriam Leitão, no Bom Dia Brasil, comentou que a capacidade de geração de energia que deve ser considerada é a média de 4.500 MW e não a que vem sendo divulgada de 11.000 MW que é a potencia máxima em período de cheia, o que faz que o investimento de 25 bilhões seja extremamente alto.


"Quando a licença prévia foi dada, os técnicos do IBAMA achavam que não estava bem avaliado o risco ambiental. Aí, pediram tempo. Mas o governo passado não deu. Exonerou gente, passando por cima das observações dos profissionais. Aí, foi dada a licença com 40 condicionantes. Como não foram cumpridos, não poderia ser concedida a licença de instalação.
Mas agora, um presidente interino do IBAMA dá uma licença parcial para a supressão da vegetação. Isso significa que eles vão desmatar 240 hectares e depois será fato consumado.
Ontem, conversando com o MP, fiquei sabendo que o BNDES, que vai financiar, deu um empréstimo antecipado de um R$ 1 bi. Mas aí perguntaram em que condições se daria isso: o banco respondeu que estava dando com o compromisso de que não seria feita nenhuma mudança no sítio antes da licença para toda a obra.
Economistas dizem que esse projeto representa um risco fiscal enorme, e os engenheiros, que os riscos nessa área não foram bem avaliados. Por isso, acho que precisa ser mais estudado. O governo, no entanto, fala que está sendo discutido há mais de 20 anos. Mas o governo Lula decidiu fazer a ferro e fogo, e o de Dilma está indo para o mesmo caminho."


O documento publicado nesta quarta-feira concede uma licença de instalação parcial, uma vez que o consórcio que construirá de Belo Monte não cumpriu as condicionantes impostas pelo próprio Ibama quando emitida a licença prévia em 21 de julho de 2010. Licença parciais, no entanto, não existem na legislação ambiental brasileira.

Leia a íntegra

A gente vai ficar só olhando???

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

A necessidade de pertencer

Assistindo o programa, Cidades e Soluçoes, da Globo News, sobre a rede de solidariedade que se criou após a tragédia na serra do Rio, me pus a pensar sobre uma pergunta feita pelo apresentador Eduardo Grillo sobre o que teria motivado o brasileiro a se mobilizar tão fortemente para realizar um trabalho voluntário de ajuda, uma  vez que o trabalho voluntário não é uma tradição do povo brasileiro. 
Taxista Sao Gonçalo transportam donativos - Andre Redlich

Parei então para pensar se concoradava com este ponto de vista. É verdade que se pensarmos em trabalho voluntário nos moldes da sociedade americana, onde ele é quase socialmente obrigatório, pelo menos em doação financeira, o Brasil não tem a mesma tradição. Meus superficiais conhecimentos de sociologia me fazem pensar em Max Weber, e seu clássico a Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo.


Se há, como há, um “marketing do bem” que promove a solidariedade social,
devemos admitir que a solidariedade se tornou um valor de mercado e um
valor para o mercado. Logo, estamos diante de uma “solidariedade de
mercado”, uma solidariedade que não é bem um sentimento interior, mas uma
imagem de solidariedade. É uma imagem que ganha vida própria e que vai se
associar a outras imagens para valorizá-las - imagens de empresas, de marcas,
de governos, de governantes, de personalidades públicas. A solidariedade,
assim posta, como imagem autônoma e como imagem que reforça outras
imagens, existe no mercado não como um fim que se basta, um fim
desinteressado, mas como um argumento para o consumo [...]. Portanto, esse
tipo mercadológico de solidariedade, [...] “agrega valor” a produtos, marcas,
empresas, pessoas e governos. A solidariedade assim posta, mais que um
valor ético, é um fator de lucro [...] É necessariamente, uma solidariedade
exibicionista (BUCCI, 2004, p. 182).

Com relação a esse exibicionismo, pode-se tomar as considerações de Max
Weber a respeito do americanismo, da ética protestante e do espírito do capitalismo. O
autor comenta o caráter utilitarista das atitudes morais de Benjamin Franklin ao
defender que a honestidade, a laboriosidade ou a pontualidade são úteis porque
asseguram o crédito, razão pela qual são virtudes. Daí Weber depreende que a aparência
de honestidade bastaria quando fizesse o mesmo efeito que a honestidade em si, e isto
fica claro quando Franklin, em sua autobiografia, discute o valor da estrita manutenção
da aparência da modéstia e da depreciação assídua dos próprios méritos com a
finalidade de obter, posteriormente, reconhecimento geral. (WEBER, 1996, p. 32)

Leia a íntegra

Mas este caso não se aplica ao que estamos assistindo em relação a tragédia da região serrana do Rio. Qualquer um, mesmo sem estar fisicamente lá, pode sentir que há um espírito real de solidariedade, e mais do que isso compaixão. E isto é uma tradição católica, no que há de melhor da sua filosofia. Podemos observar em outros eventos da América Católica, como no caso dos mineiros no Chile, que tanto emocionou o mundo. 

O brasileiro de modo geral, especialmente aqueles menos favorecidos, é solidário, sim. E age não pela razão, mas pela emoção. O que não existe no Brasil é uma rede social organizada neste sentido. No meu ponto de vista, por conta das nossas elites, que até muito pouco tempo se mostraram indiferentes, e pior, muitas vezes usaram tragédias como forma de preservação de poder e corrupção, como no caso da seca no nordeste. Isto, sim, nos difere de países protestantes, como os EUA. (Ou não, veja New Orleans).E também acho que é esta mentalidade que está se transformando no Brasil, processo que começou com iniciativas emblemáticas como foi o Fome Zero, do sociólogo Betinho de Souza, a Pastoral da Criança, da Dra Zilda Arns ou a Comunidade Solidária, de Ruth Cardoso. A partir daí, pelo que sei,  o Brasil está se tornando uma referência mundial no que diz respeito ao terceiro setor, com ampla mobilização das elites no que se convencionou chamar Responsabilidade Social.

Betinho


Mas será que só isto explica o que se vê no Rio?
Acho que não. Me vem na cabeça um outro conceito: o de pertencimento

"A sensação de pertencimento significa que precisamos nos sentir como pertencentes a tal lugar e ao mesmo tempo sentir que esse tal lugar nos pertence, e que assim acreditamos que podemos interferir e, mais do que tudo, que vale a pena interferir na rotina e nos rumos desse tal lugar."


“Em todos os lugares, cada vez mais, as pessoas sentem a
necessidade de crer e de se inserir em locais de pertencimento. Assim, à
medida que cresce o global, também se amplia o sentimento do local’. (...)
‘As razões desse paradoxo são múltiplas, entre as quais mencionemos a
seguinte: a globalização, sinônimo de mercantilização do mundo, introduz
localmente um tipo de incerteza e de vertigem na mente humana. Uma das
maneiras de reagir a isso consiste na busca da certeza de que somente a
proximidade pode garantir, até certo ponto, o sentimento de pertencer.”
(Zaoual, 2003: 21) 
 
Desta forma vemos os Moto-clubes, os radio-amadores, a Cruz Vermelha, o Facebook, o condomínio. A sua rede. A que voce pertence, agindo, interferindo, ajudando, transformando a realidade.
É uma hipótese, e certamente é assunto para muita discussão.


Leia o trabalho de Joanildo A. Burity
IDENTIDADE E MÚLTIPLO PERTENCIMENTO NAS PRÁTICAS ASSOCIATIVAS LOCAIS

Ou será que quem tem razão há muito tempo é o Quiroga e a busca pelo bem comum já está escrita nas estrelas, é inevitável.


21/01/2011
AR DE ATRASO.
Data Estelar: Sol ingressa no signo de Aquário; Lua ainda é Cheia em Leão.
Todas as sociedades que se destacam e merecem ser chamadas de civilizadas respeitam o bem comum. Esse respeito é exemplo vivo demonstrado pelos governos e leis promulgadas, assim como também pela maneira criteriosa com que o dinheiro dos impostos é utilizado. Com o exemplo vindo de cima, as pessoas comuns praticam o mesmo. Evidentemente, haverá essas ou aquelas que continuarão com suas práticas egoístas, atentando contra o bem comum, mas serão de escasso número. Enquanto isso, nas sociedades em que os governos, leis e exemplo dos que ocupam cargos importantes não demonstram o respeito pelo bem comum, raras serão também as pessoas que se ocuparão com isso e a sociedade como um todo transpirará ar de atraso.


Agora, como a sociedade vai se comportar nos próximos meses, passado o impacto inicial é a grande questão. Como está o Morro do Bumba, você sabe?

domingo, 16 de janeiro de 2011

Hidroeletricas e as chuvas do sudeste, será que tem conexão?

Belo Monte, capítulo 5
Rios Flutuantes, umidade da Amazonia e desmatamentos: catástrofes anunciadas


A Usina de Belo Monte, mais uma vez, está em pauta causando o segundo pedido de demissão em poucos meses de presidentes do IBAMA por não concordarem com o licenciamento definitivo da obra.   Abelardo Bayma, funcionário de carreira do orgão, preferiu se afastar a ceder às pressões da EletroNorte.

Em artigo publicado no Estadão, o jornalista Washington Novaes, inumera alguns dos motivos

... Já a discussão sobre o projeto de Belo Monte (classificado pela revista do Instituto de Engenharia de São Paulo como "vergonhoso") parece não ter fim. A última vistoria do Ministério Público Federal mostrou (Amigos da Terra, 17/12) que não estão sendo cumpridas condicionantes impostas pelo Ibama na análise do estudo de impacto ambiental. Em dez anos são dez ações judiciais em torno do projeto, que nem sequer se sabe exatamente quanto custará, pois as informações variam de R$ 7 bilhões a R$ 30 bilhões. Nem quanto gerará de energia, pois isso depende de transposição de águas na seca (e para isso se fala na escavação de um canal maior que o do Panamá, sem explicar onde se depositarão os sedimentos). Ou para quantas pessoas se terá de prover instalações (20 mil? 80 mil?). Ainda assim, a usina é incluída no livro de realizações do atual governo e a Eletronorte anuncia o início das obras para abril de 2011, sem que 40 condicionantes do Ibama tenham sido cumpridas (o órgão já deu dois pareceres contra o início da construção), sem que se tenha autorização para remover comunidades indígenas atingidas e sem que se saiba até mesmo para onde irá a energia (ao que parece, em parte para usinas de alumínio e alumina no Pará. Será com subsídios na tarifa?). ...

Mas o que Belo Monte tem a ver com a catastrofe da região serrana do Rio?

Belo Monte em si, agora em 2011, nada. Ela nem foi construída ainda. Mas em 2015, será que não estaremos de novo falando em catástrofes. Há dias especialistas estão em todas as midias tentando explicar as causas da tragédia que aconteceu no Rio. Os meteoroogistas, os geólogos, geotécnicos. No começo a explicação estava nas construções irregulares nas encostas. Mas não explica tudo. Casas bem construídas também foram devastadas, morros com mata nativa e nenhuma construção também desmoronaram.

Então, tem a zona de convergência do Atlântico, um fenômeno que já explicava tudo anos atrás.


Como já descrevia Suzana de Sá Kloh em seu blog Reinvenção em dezembro de 2006


É a tal zona de convergência do Atlântico Sul. Há poucos anos as explicações para o mau tempo em Petrópolis se baseavam nas freqüentes frentes frias - que, certamente, vinham de São Paulo sem escala no Rio, parando aqui na serra. Agora vem essa tal zona. Nem se ouve mais falar em El Niño. Só há essa tal zona. Tudo convergindo sobre nossas cabeças e, sobretudo, sobre as cabeças dos petropolitanos, sobretudo os que moram à beira da serra, como eu.

Ou será a zona de convergência intertropical?

Bom a unanimidade agora diz que as fortes chuvas foram causadas por um corredor de umidade vinda da Amazonia. Muito bem, quem como eu já passou muitos verões no litoral paulista, sabe que a chuva chega quando venta sudoeste ou noroeste. Quando venta sudoeste o tempo também esfria, quanto venta noroeste esquenta e chove forte. Tudo isso é normal. O que não foi normal na historia do Rio foi intensidade da chuva. E por que será que veio tanta agua da Amazonia, hum?
Precipitação Média região serrana verão de 2005
 Em 12 de janeiro de 2011 choveu 182 mm em Nova Friburgo e 124 mm em Teresópolis

Miha amiga, bióloga, Giuliana Martins tem uma teoria: 
o desmatamento da Amazonia, agravado pelo recente desmatamento na região do cerrado,  com suas enormes plantações de soja; as muitas pequenas usinas hidroeltéricas construidas  recentemente no centro-oeste, bem como as próprias estradas asfaltadas e as cidades que crescem em volta dela, causando impermeabilzação do solo,  estão criando corredores de umidade que não encontram as mesmas barreiras naturais de pouco tempo atrás. Assim parte da umidade, que seria absorvida pela solo tanto na Amazonia quanto no Cerrado segue em frente rumo ao sudeste. E as represas? As represas repelem a chuva, porque tudo está baseado em eletromagnetismo e diferença de potencial, e além do mais causam ainda mais evaporação de água.

A Zona de Convergência do Atlântico Sul

(ZCAS) é uma região com uma extensa faixa e bandas de nuvens formadas desde a Amazônia, Brasil Central e Sudeste até o Oceano Atlântico. Essas nuvens estão associadas com chuvas ora fortes, ora moderadas, ora intermitentes, que persistem por no mínimo quatro dias e podem causar grandes transtornos, tais como alagamentos, inundações, desabamentos e transbordamentos.

 Francisco de Assis Diniz , bacharel em  meteorologia

Como bem demonstrou o Instituto de Física da USP, se o desmatamento da parte oriental leste do bioma amazônico atingir 40%, a sobrevivência da floresta estará totalmente em risco, pois o fluxo do vapor de água queajuda a formar as chuvas da região, os nossos rios flutuantes, poderá ser interrompido, colocando em
risco a biodiversidade e ameaçando seriamente a economia das regiões Sul e Sudeste


Assim, uma visão localizada dos efeitos da construção de uma usina das proporções de BeloMonte, me parece muito limitada. Pensar apenas nos impactos locais da usina é esquecer que vivemos em um sistema, chamado Terra, onde tudo está interligado. Represar rios que formam as grandes bacias amazônicas para gerar energia para a industria do Aluminio, que será consumido na China é brincar com fogo. 
Em 2011, infelizmente já estamos sentindo as consequências, como será em 2015?

Leia Mais: WWF

Laboratório de Biogeografia e Climatologia - UFV